Texto-pivô: A descoberta das movimentações estratégicas americanas em Portugal poderiam causar uma guerra política e militar de enormes proporções. A preocupação de Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa começou a tornar-se inconveniente para o governo americano.
Vivo 1: Apesar das teorias que discutem se o atentado foi dirigido a Amaro da Costa ou a Sá Carneiro, para Frederico Duarte Carvalho esse não é o principal foco do caso Camarate. O jornalista que investiga há dezenas de anos este momento marcante para a democracia portuguesa, preferiu concentrar-se nos motivos que poderiam levar a uma queda propositada do avião.
Entrevistado 1: Porque naquela altura em que Sá Carneiro, o avião, cai e há o atentado de Camarate, Portugal estava a enviar armas de forma ilegal para o Irão, furando um embargo internacional que iria provocar, caso fosse conhecido a verdadeira causa, como se fosse relacionada a morte de Sá Carneiro, naquela altura, com este tráfico de armas para o Irão, iria provocar uma revolução nos Estados Unidos, uma revolução democrática nos Estados Unidos e que abalava e que ainda hoje poderia abalar.
Voz Off 1: A primeira nota pública sobre a movimentação das armas, foi feita pelo Diário de Lisboa no dia 5 de Junho de 1979. O jornal afirmou que se encontrava um avião no aeroporto de Lisboa com armas destinadas à Grécia. Peritos afirmaram ser uma manobra de diversão e que as armas tinham como destino outros países como o Irão.
Entrevistado 2: Há aliás uma notícia do Portugal Hoje na altura, vim descobrir mais tarde, que denunciava que esse tráfico estava a passar por Lisboa e houve um desmentido do Ministério da Defesa que isso estivesse a acontecer, eu acho que isso pode ter sido o disparador do atentado. O Ministério da Defesa desmentiu porque não tinha nada a ver com isso, mas desatou a fazer perguntas, desatou a querer saber o que se passava e foi ao querer saber o que se passava, que foi inquietar as pessoas que estavam a fazer isso.
Voz Off 2: Ronald Reagan foi eleito presidente dos Estados Unidos da América, com George Bush como vice-presidente, nas eleições de 4 de Novembro de 1980. Uma humilhação para o presidente derrotado Jimmy Carter, que não conseguiu cumprir a promessa de resolver a crise de reféns no Teerão a tempo das eleições. O que lhe valeu uma derrota para os candidatos republicanos.
Entrevistado 1: Ora, Sá Carneiro morre no meio deste caso. Há as eleições a 4 de Novembro de 1980, Sá Carneiro morre a 4 de Dezembro, mas os reféns só foram libertados no dia de tomada de posse de Ronald Reagan que é 20 de Janeiro de 1981. Se Sá Carneiro tivesse dito antes da tomada de posse, que havia armas a ser enviadas para o Irão ilegalmente e que isto consubstanciava a ideia de que houve uma negociação secreta da campanha Reagan e Bush para a não libertação dos reféns, enfraquecendo a campanha do Jimmy Carter, isto seria um escândalo mundial.
Voz Off 3: Depois da tragédia de Camarate ainda foram reportados dois envios de armas para o Irão, no dia 9 de Dezembro de 1980 e no dia 26 de Janeiro de 1981. Nessa altura vigorava ainda o embargo internacional que proibia a transação de armas para o exército iraniano. Este negócio de armamento encetado pelo governo americano era assim ilegal.
Entrevistado 2: É evidente que se num país de trânsito como o nosso, caso fosse descoberto em 1980, no início do conflito, não em 1984 quando já se tinha passado, um escândalo destas proporções teria consequências políticas e militares de enorme proporção. Eu admito que tenha vindo daí a ordem para fazer este atentado.
Voz Off 4: Descobrir que a queda que vitimou os governantes portugueses podia não ter sido acidental, foi um duro golpe para as instituições internacionais, que não contavam ser questionadas pelos motivos de um aparente acidente, de um pequeno país relativamente irrelevante como Portugal.
Vivo 2: Mais de 30 anos depois, persiste um vazio de informação nos próprios arquivos da agência secreta americana, que se recusa a revelar as comunicações entre Portugal e os Estados Unidos nesse período. Em Portugal e sobre alta pressão, o Ministério Público e a Polícia Judiciária também se recusam a corrigir a tese de acidente. Quem não se conformou e foi à procura de evidências, não teve vida fácil.
Entrevistado 2: Portanto eu não percebo, não consigo perceber, como é que a Polícia Judiciária e o Ministério Público perante uma evidência de um depoimento mal interpretado porque mal colhido, não manda refazer os autos com base numa testemunha ocular desta responsabilidade, que relata ter visto uma pequena explosão no início do voo. Não consigo compreender.