Texto-pivô: Apesar das teses iniciais, que apontavam Sá Carneiro como alvo do atentado de Camarate, a reconstrução do dia fatídico para os dois políticos levantou novas suspeitas. Amaro da Costa andava a fazer demasiadas perguntas sobre uma grande operação internacional e a sua voz podia tornar-se inconveniente.
Entrevistado 1: Era muito difícil ser para o Francisco Sá Carneiro. Como é que eles iam adivinhar que o doutor Sá Carneiro iria naquele avião para o Porto!?
Vivo 1: No dia 2 de dezembro de 1980, Conceição Monteiro reservou três bilhetes na TAP, na véspera do comício-extra que estava marcado para o Porto. O avião partia às 20h20.
Voz-off 1: Amaro da Costa também tinha decidido viajar para o Porto, de onde tinha vindo de madrugada no mesmo Cesna 421. O avião esteve estacionado até à viagem fatídica.
Entrevistado 2: De facto, o Adelino Amaro da Costa tem um despacho com o doutor Sá Carneiro no final da manhã e é aí que é feita a combinação.
Entrevistado 1: Passaram… para ir para o gabinete do primeiro-ministro tinham de atravessar o meu gabinete porque era a passagem para o gabinete do doutor Sá Carneiro. E, quando vieram os dois - o doutor Sá Carneiro ia buscar qualquer coisa ao gabinete, e o engenheiro Amaro da Costa veio atrás dele e disse “ó Francisco, como é que vai para o Porto?”
Vivo 2: A espontaneidade com que foi preparada a deslocação de Sá Carneiro ao Porto deixou muitas dúvidas a Conceição Monteiro, que esteve envolvida em todo o processo.
Entrevistado 1: [Tiago] Ele esteve mesmo para ir na Tap, não esteve!? [Conceição] Pois esteve… só quando o motor pegou é que o Jorge Albuquerque comunicou à torre “podemos levantar, já tenho tudo… podem… digam à TAP que os passageiros não vão embarcar”. Porque eu, a certa altura… dizem, que ele a certa altura, deve ter dito qualquer coisa, porque há essa comunicação.
Entrevistado 2: Um dia, numa sala, um velhote virou-se para mim e disse assim “pois é… se vocês tivessem morrido em vez deles, eles não deixavam pedra sobre pedra, para saber quem vos tinha matado. E vocês estão nas tintas para aquilo que se passou!”
Voz-off 2: A determinação de Amaro da Costa era reconhecida no país e o ex-ministro da Defesa terá ido longe demais na investigação de algumas instâncias internacionais.
Entrevistado 1: Eu sempre disse, o atentado era para o Adelino, que era ministro da Defesa, e havia o problema das armas para o Irão.
Entrevistado 2: Portanto, aí foi surgindo a ideia de que podia ter sido contra Amaro da Costa e ter a ver com as armas para o Irão. Porque ele, de facto, mostrou preocupação com isso e sabemos que o assunto de tráfico de armas é um assunto suficientemente perigoso e quente para poder determinar que alguém mande matar outro.
Voz-off 3: Ainda que permaneçam as dúvidas sobre quem era o alvo a abater, outros factos reforçaram a tese de que as motivações iam além-fronteiras e punham em causa uma grande operação internacional.
Entrevistado 3: Diziam que era um atentado para Adelino Amaro da Costa, como se isso fizesse alguma diferença entre ser menos grave ou mais grave do que para um primeiro-ministro. E depois, diziam que era o Adelino que andava a investigar um fundo de defesa militar do ultramar, como se a investigação fosse só dele e não estivesse coordenada com o primeiro-ministro e não houvesse esse motivo. Mas, depois eu descubro ainda uma possível explicação que juntava estas todas e aí sim seria uma outra, que seria a explicação internacional de um tráfico de armas para o Irão…
[Reportagem de Guilherme Caroço e Tiago Oliveira]